segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

Alucinação aleatória de uma alma magoada.

“Eu to com frio...’’ foi o que consegui dizer, depois de muito tempo. Ela me abraçou e passou os dedos quentes pelo meu braço gelado, encostou seu rosto no meu ombro e se afogou no meu cabelo loiro. “Eu nunca vi um cabelo tão cheiroso, menina.” Respirei fundo, tentando preencher o vazio em que me afogava, não adiantou. Fechei os olhos e voltei a pensar na conversa que acabava de ter. Ela estava bêbada, ridiculamente bêbada naquele bar daquele bairro pobre. Quando bebia, sempre me contava a verdade, e eu perguntei. Pedi pra ela me dizer toda a verdade. E então ela me contou...

‘Quando te conheci, te amava de verdade. Senti toda a adrenalina, a paixão, os ciúmes, a raiva, a preocupação. Fiquei apaixonada até o dia que você me traiu, e aquilo partiu meu coração. Eu sei que te traí antes e parti seu coração também, mas foi diferente, eu sempre fui assim, você esperava que eu fizesse isso. Você partiu meu coração por sempre ter sido boa demais. Depois, meu amor foi morrendo, mas eu achava que ainda podia recuperá-lo, não queria perder você ainda. Continuei com você, fingindo estar tudo bem. Mentindo cada vez mais, a cada vez que saía sem você, te traia com uma pessoa diferente, homens fortes e másculos, meninas bonitas e tatuadas, magras e ricas. Você nem imagina a quantidade de vezes que já disse que era solteira e escondi minha aliança. Chegava em casa, tomava um banho e vestia minha fantasia de namorada perfeita. Eu admito que não fingi muito bem, paramos de fazer sexo, de nos beijar, de andar de mãos dadas, e eu procurava desculpas o tempo todo. Não queria perder você, mas também não suportava a idéia de te tocar. Acho que odiava você. E você, ah, sempre boba e apaixonada, eu não precisava de muito para te agradar... Acha que não vi todas as vezes que você chorou a noite, escondida? Acha que eu realmente estava dormindo, quando você falava baixinho por favor, volta a me amar e ser como antes? Sabe, eu escutei tudo, todas as vezes. Eu não tinha como responder, não podia simplesmente dizer adeus. Você nunca me deu motivos, não é? Depois, você descobriu uma das várias traições, e quis terminar. Eu vi que iria realmente te perder, vi que tinha voltado a te amar. E fiz de tudo pra voltar a ser a namorada perfeita. Tentei de verdade, posso dizer que voltei a te fazer feliz, por alguns dias. Até que você me magoou, tudo bem que não foi nada comparado ao que eu já tinha te feito, mas fiquei triste, e não queria estar com alguém que me fizesse infeliz. Você me implorou perdão, e eu não podia dizer não. Decidi que seria a pior namorada do mundo, pra que você começasse a me odiar tanto quanto eu te odiava. Foi difícil pra mim, ser tão cruel, mas era parte do plano. Naquele ultimo dia meu coração apertou, sabia? Eu, por algum motivo, não queria ser cruel. Não queria partir seu coração. Fiquei triste por te ver chorar, e não queria dizer adeus, mais tarde. Eu olhei nos seus olhos e vi que você sentiria saudades de mim, quando eu fosse embora. Você nunca me odiaria, e eu tive certeza disso. Eu teria que fazer diferente. Teria que partir pra sempre. E então, eu parti. Sem te pedir desculpas, sem dizer adeus, e de um modo que eu não sentiria saudade. Esperei que você me odiasse por isso, mas nem assim você me odiou. Era amor de verdade, né? Desculpa por ter feito você infeliz assim.’

Chorei depois de passar toda a fala dela mais uma vez pela minha cabeça. Ela havia morrido pra se livrar de mim, e agora, tinha voltado de alguma maneira inexplicável só pra responder as minhas perguntas.

‘Será que eu... posso ir embora com você?’ Perguntei, mesmo sabendo a resposta. Sua mão parou de tentar esquentar meu braço ainda frio e apertou forte minha mão. ‘Não, não pode, neném... Eu vim aqui pra te pedir pra você viver. Não desiste de viver nunca, por mais difícil que seja.’ Ela ficou calada de novo, e eu também. Agora suas lágrimas molhavam meu ombro. ‘No ultimo segundo eu me arrependi, sabia? Decidi que queria ficar ali com você, nem que tivesse que vestir a mascara de namorada perfeita todos os dias.’. Eu tive que respirar fundo antes de responder que eu não iria ligar de chorar baixinho toda noite. ‘E porque você não parou?’ Ela terminou o copo de cerveja num gole só, me deu um beijo suave nos lábios e sorriu aquele sorriso mais lindo de todos. Levantou e disse ‘ah, já era tarde demais.’ E sumiu, tão de repente como havia chegado.

Nenhum comentário:

Postar um comentário